domingo, 29 de março de 2009

distância de um mundo que era meu

me dói ver (e saber) como eu sou descartável nos contextos que eu queria ser essencial.
como riem,
se divertem,
se completam sem mim.

eu, a que foi pra longe.
a que tomou novos rumos.
a que nunca tem tempo.
eu, a "adulta prematura",
a sem graça prematura,
a que de tanto "não posso"
passou a nem existir
no hall de cogitação.

como me dói ver (e saber).
o telefone mudo de alegria.
as fotos em lugares que eu nem sabia.
e que eu realmente acho que eu nem poderia ir.

mas incomoda nem ter sabido.
incomoda terem desistido.
desistido dos meus "nãos".
dos meus limites.
do meu cansaço.
da minha falta de brilho.

afinal, eu não virei isso?
peso.
compromisso.
cansaço.
choro engulido.
tempo corrido.

E dói ver (e saber).
Os caminhos se bifurcando.
E eu cada vez mais sozinha.
Mais sobrecarregada.
E com cada vez menos gente lembrando.

segunda-feira, 23 de março de 2009

rotina

acorda.
se assuta.
reclama.
levanta.
se arruma.
reclama.
come.
corre.
reclama.
embarca.
senta.
reclama.
cochila.
desembarca.
reclama.
embarca de novo.
disputa.
reclama.
se espreme.
se equilibra.
reclama.
desembarca de novo.
corre.
reclama.
sobre.
ingressa.
reclama.
trabalha.
engole.
reclama.
trabalha.
trabalha.
reclama.
encerra.
corre.
reclama.
empurra.
força.
reclama.
embarca.
se mata.
reclama.
desembarca.
corre.
reclama.
embarca.
se preocupa.
reclama.
desembarca.
chega (cansada).
reclama.
e olha.
recebe.
se emociona.
abraça.
cheira
sorri.
e lembra do motivo.

Já não reclama.
- Agradece.

segunda-feira, 16 de março de 2009

benjamin button

e se eu fosse benjamin button?
e se eu visse todos que cuidaram de mim envelhecendo, enquanto eu estivesse indo no fluxo contrário?
e se eu fosse virar um bebê lá na frente?
quem iria cuidar de mim?
quem iria me amar na involução da razão?
quem teria paciência?
quem me amaria sem condição?

...e se eu fosse benjamin button?

sexta-feira, 13 de março de 2009

reviravoltas

roda mundo
roda gigante
roda moinho
roda peão
o tempo rodou num instante
nas voltas no meu coração.....

quinta-feira, 12 de março de 2009

sobrevivendo

Ceifar antes de ser ceifado.
Não é por aí que segue a lei da sobrevivência?
Não é da força pra essa atitude que depende a permanência?
Ceifar antes de ser ceifado.
Ceifar antes.
Antes de o ser.
Antes.
Ver antes.
Saber antes.
Sentir antes...
Antes.
E será que é antes?
Será que teria o depois?
Pressentimento ou medo?
Sabedoria ou insegurança?
Sobreviver.
Ceifar antes de ser ceifado.
Ainda que sem a certeza.
Ceifar.
Sobreviver.


Não há tempo de saber.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Não deu

Eu queria ter pra contar a história daquele álbum que eu imaginei.
Mas não deu.
Não deu tempo de viver.
O mundo atropelou.
Não deu.
Passou.
Passou a época.
Passou a chance.
O cimento secou
E eu não tive tempo de voar.
Não adianta reclamar.
O cimento secou.
Eu fiz secar.
Passou o tempo de voar.

E eu fico daqui vendo as fotos que eu não tirei
Do álbum que eu queria ter na estante
Mas não deu...

terça-feira, 10 de março de 2009

anoitecimento

Não se vê o anoitecer. O acontecimento do processo. Apenas constata-se que houve, após.
Os olhos acostumam-se tão aos poucos que já é noite. Assim, no susto.

E assim é com a gente. Não vemos as mudanças. Não percebemos. Vivemos no ciclo dos dias e nos atentamos depois pra quem (agora) somos. Constatamos que passamos a ser. E depois contrapomos com quem éramos.

Daí mensuramos a mudança - a subtração do presente com o passado, e nos deslumbramos com o quão sorrateiro foi o desenrolar do processo.

Bom... "É assim" não... Costuma ser...

Mas é estranho quando se vê o anoitecer. Quando a consciência não se distrái um segundo e percebe cada nuance da alteração da coloração do céu. Quando se percebe cada centésimo da diferença presente x passado antes o todo possa ter sido encontrado na subtração do processo concluído.

É estranho quando percebemos o nosso anoitecer. Quando nos damos conta dos gostos gradativamente se alterando. Das vontades, dos objetivos, das aspirações, preferências e percepções em plena mutação. Quando a gente coloca em cheque o tempo todo aquilo que sempre defendemos ser, dando espaço a uma nova percepção que nem mesmo nós conhecemos.

E, pior! É estranho percebermos passo a passo que estamos tão próximos de tudo que sempre julgávamos (e jurávamos!) tão longe, e que sempre, em nome do espírito revolucionário, manteríamos assim... Estamos tão... tão próximos!... Tanta caretice, tantos desejos batidos, tantas vontades comuns, tão igual à todos...

Chego a rir da Mariana que ia mudar o mundo. E o pior é que rio justamente no meio do processo de percepção de como ela está se enquadrando que a risada vem, e não no distanciamento da de antes pra de depois. É no processo. É ainda estando com um pé lá, no lugar-chacota. Ainda agindo um pouco como a mariana-chacota, mas já sem a conduta caber bem.

E é estranho assim... perceber o "anoitecimento" de mim!